quarta-feira, 18 de março de 2015

Pedaços de um eu que sou eu...


Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.
Fernando Pessoa
Uma mulher que gosta de viagens sonha muito mais do que as outras. Voa mais alto e mais depressa mas também aterra mais vezes de beiças no chão. Catrafode-se nos sonhos, esfarrapa-se por eles, luta sem desistir e algumas vezes sem também conseguir. Mas está lá, continuadamente. Só compra uma máquina de café expresso depois de muita insistência e muitos comentários parvos dos amigos - mas nesta casa não há máquina de café - porque prefere usar o dinheiro da compra da máquina numa aventura ao pôr do sol na praia do Pego ou comer um bela mariscada numa esplanada em Porto Covo. Não lhe interessa as distancias, não liga a quilómetros, Madrid é já ali, num saltinho, Gibraltar faz-se em meia dúzia de horas de viagem, num abrir e fechar de olhos, Casablanca fica à distância de um dia e uma viagem de Ferry Boat, o tempo é relativo para ela, adora conduzir, nada a cansa e do longe rapidamente faz perto. Veste-se de acordo com a ocasião, quase sempre de ténis confortáveis e meias coloridas e junta-lhes umas calças de ganga ou uns calções, o único adereço imprescindível é uma mochila cheia de coisas que podem fazer-lhe falta, uma garrafa de água, toalhetes de higiene, uma peça de fruta, umas bolachas e obviamente a máquina fotográfica para reter cada dia. Guarda religiosamente recordações de cada local onde já foi feliz. Uma pedra trazida dos Picos da Europa, um aloha da noite temática da festa na discoteca nos Alpes Suíços, uma caixinha de bolachas comprada em Amesterdam e que já há muito perdeu as bolachas. Não tem medo de acampar, ou de ter que passar a noite dentro de um carro, já o fez mais do que uma vez, já viajou de comboio semanas a fio para atravessar a Europa sem ter direito a um duche e guarda consigo o bonito recorde de uma semana inteira sem tomar banho. Gosta de ir aos lugares que não constam dos roteiros turísticos nem dos flyers das agências de viagens, onde só se chega com um guia e quase sempre a pé por trilhos, ou veredas mal assinaladas. Não lhe importa a chuva, o frio, ou o sol quente, viaja porque gosta, porque cada local é único e vale a pena, porque viajar é conhecimento e descoberta e é sempre bom partir à descoberta. Gostava de ver tudo mas sabe que é impossível e nem duas vidas lhe chegavam. Sente todos os dias a falta de tempo. Gosta muito mais de partir do que de ficar, e quando chega, a primeira coisa com que volta a sonhar é em partir. Sabe o nome de todos os lugares maravilhosos onde quer ir, tem um mapa mundi onde coloca pins em todos os locais onde já esteve, faz listas de lugares que não vai desistir de conhecer. E no coração dela ela quer que "ele" a acompanhe, que tenha a coragem suficiente para lhe dar a mão e acompanhá-la sempre que ela fala da Tunísia e da estranheza das praias patrulhadas a cavalo, de Cartago debruçada sobre o azul do mar, ou sobre as Highlands nas terras altas da Escócia pintadas de verde e pedaços de chuva fria atravessadas por rios negros de basalto. Ela quer levar-te a todo o lado onde já foi e onde ainda sonha ir. Faz cenários, estórias de filmes, vai até fazer-te acreditar com muita força que passar a noite num saco cama, abraçados e a respirar para cima um do outro debaixo de um céu imensamente estrelado te faz sentir muito mais feliz que qualquer quarto de hotel de umas míseras cinco estrelas. Não desistas dela, ela vai saber ouvir-te e saber ajudar-te como todos se entreajudam num trekking numa tarde de fim de semana, leva a vida subindo cada obstáculo, de cada vez, um a um, e enfrenta os dias da mesma forma. Não faz grandes planos, não liga a coisas materiais, vive dos sonhos e alimenta-se do prazer que retira das pequenas coisas, do cheiro da terra molhada, dos pingos de chuva que se lhe agarram ao cabelo, dos salpicos da água salgada nos lábios junto à rebentação, dos diferentes sabores das comidas locais. Tão depressa calça as barbatanas e mergulha para ver a Barreira de Corais como aperfeiçoa o esqui e insiste arduamente com o corpo para um dia te poder acompanhar nas descidas alucinantes das pistas pretas. Quem sabe um dia... mas ela não é de desistir. E é uma mulher que adora viagens.

12 comentários:

  1. E as viagens dela são as que a fazem sorrir e ser feliz. E isso sente se em cada palavra que ela escreve :)

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    1. Imprópria: Ela sem as viagens de sonho dela e ele nos sonhos dela não seria tão feliz....
      Acabei de chegar e já tenho outra viagem a ser construída na terra dos sonhos, não muito grande. qb apenas, para ser possível.

      Beijoooooo Miúda Imp.

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  2. inveja da foto :/ tb queroooooo

    Obrigada pela visita, sim voltei até... quando... não sei :)

    beijinho

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    1. Baby: Fizeste bem.
      E já vi que agitaste as águas aqui na blogocena.

      Beijinho**

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    1. Sol: Sou grande em altura mas pequena em tamanho...

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  4. Gosto de viajar mas, felizmente ou infelizmente já nem sei, só tenho viajado porque me mudo para lugares diferentes, países diferentes e uma vez até outro continente. Viajar é bom e, se bem aproveitado, faz-nos maiores, dá-nos mundo por assim dizer.
    Curioso falares da Tunísia, um sítio muito especial para mim e que estes dias vive uma página negra da sua história :(

    Beijos e que venham mais boas viagens!

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    1. PM: Por acaso quando vi as noticias (praticamente não vejo televisão por isso muita coisa passa-me ao lado) vi o Museu do Bardo e o atentado que recentemente ali houve. Já ali estive, já visitei todas aquelas salas cheias de arte e sabe tão bem reconhecer os lugares até porque há pedaços de história que com o tempo vão-se perder...

      Beijinhoooooo cheio de sonhos

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  5. sonhar é já, em si mesmo, viajar

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    1. Pó: Para mim uma viagem começa quando a idealizo, pesquiso locais a visitar, organizo o meu tempo, antecipo assim o que vou encontrar... É sonho puro sim:))

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  6. Muito bom. Vidas simples (não num sentido depreciativo!) merecem felicidade ... simples :)

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    1. Son da Mamã: Acredito que a felicidade reside nas pequenas coisas...

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Diz aí nada ou coisa nenhuma.