sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Em pedaços...


Falhar, só te prometo falhar!
Pedro Chagas Freitas


Numa obra, trabalhavam vários operários, pintores, pedreiros, canalizadores, electricistas, estucadores, etc. E havia um estucador que estava na firma havia muitos anos, e não sei se por desleixo, se por não saber mais do assunto, as paredes não ficavam grande coisa... ou melhor, se ele se dedicasse e esforçasse as paredes podiam ficar mais direitas.

O chefe da obra, um engenheiro, passava pelo estucador e ia lhe dizendo para fazer a parede mais direita, e ele dizia que sim, mas ia deixando a parede na mesma. O chefe, ia-o avisando uma e outra vez, e ele pouco ou nada melhorava as paredes.

Um dia o chefe disse-lhe, novamente a mesma coisa, ou seja para ele colocar a parede mais direita.

O estucador, desta vez vira-se para o chefe e diz-lhe que não dá, que é impossível colocar a parede mais direita, porque isto e aquilo, e blá, blá, blá.

E o chefe, disse-lhe: - Olha que dá!
E ele: - Não dá
O chefe: - Por favor não me faças provar que dá.
Ele: Prove-o então!


O chefe, tirou a gravata, arregaçou a camisa Pierre Cardin, agarrou na talocha e na massa e começou a dar na parede. Passados uns bons vinte minutos, e já todo cheio de massa, olhou para a parede e para o estucador, já acompanhado de todos os trabalhadores que tinham parado para ver aquele espectáculo e disse: - Pronto é assim que eu quero a parede a partir de hoje.

O estucador, engoliu em seco, baixou a cabeça envergonhado, pois nunca imaginou que um puto de fato e gravata soubesse tão bem a arte de estucador e respondeu baixinho. - Ok, sr engenheiro, eu vou me esmerar e fazer melhor.

E o chefe disse-lhe: - Não vai não! Você vai é fazer as suas contas e vai embora!
Ele: mas...
O chefe: - Não acha que eu ia chegar a este ponto, dar cabo do meu fato, fazer o que lhe competia a si e agora as coisas ficavam como antes. Está despedido!


Moral da história: Nunca subestimar o conhecimento dos outros.

Há aqui implícito um recado. A oportunidade de endireitar uma parede torta. Há pressão exercida sobre alguém que faz um trabalho que julga bem feito e afinal é imperfeito e muito aquém das expectativas. Há a total perda de confiança no trabalho que é executado. Há uma forma de poder claramente exercido de quem é mais forte sobre quem se apresenta mais fraco. Há arrogância de quem detém o poder. Há conhecimento voluntariamente omitido para permitir o factor surpresa e o direito à vitória. Há acção-reacção e consequências imediatas. Há um derrotado. Há alguém que nunca vai ter a oportunidade de endireitar a parede que durante uma vida julgou perfeita.


A vida é assim uma história imoral, incompleta, cheia de paredes imperfeitas onde há sempre alguém que despe o fato e nos procura dar subtis lições de moral.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

A nú...





A tua voz: "se um dia deixarmos de ser ridículos chegou a hora de nos separarmos".
E depois o teu toque. O teu cheiro, o teu suor, a absurda certeza de que o tempo só conta quando é tempo da tua pele. 
E novamente a tua voz: "se um dia o nosso amor fizer sentido, estarmos juntos não tem qualquer sentido". 
E depois o abraço - aquele que nem as lágrimas conseguem calar. Passar a língua por cada gota de prazer e saber que é aquilo, apenas aquilo, que faz sentido. As tuas pernas trémulas nas minhas, erectas. 
E então a minha voz: "só a absoluta insensatez é sensata quando te amo". 
E finalmente a tua voz: "fode-me até à última como se fosse a primeira vez".
E finalmente o amor.

Pedro Chagas Freitas

Não são precisas mais palavras. Já foram ditas todas. Nenhuma se gastou ou perdeu. Foram as necessárias, as correctas, as imensamente justas. Guardo para mim o que quero para mim. Lutarei até ao fim pelo o que um dia sonhei possível. Mesmo o impossível. Já estive muito mais longe, mas o facto de estar mais perto trouxe uma dor que talvez não consiga suportar. Sinto lentamente a deixar-me cair numa sensação de asfixia dolorosa, sem saída, a pique, que não me parece que traga algo de bom, mais puro ou mais genuíno. Comigo o mais nem sempre é mais, é quase sempre muito menos. É-me inato. Luto com todas as forças contra isso, fujo de mim mesma e dos meus próprios medos, mas seria muito pouco inteligente e desde logo uma batalha perdida lutar contra mim mesma. Não consigo mudar o que sou. O que pensam que sou. E aquilo que verdadeiramente sou mas que só eu sei. E muito menos ainda o que sou e não queria ser. 
Ficar ou partir? Dolorosamente não sei.